TV EM QUESTÃO
O agendamento da violência
O efeito
“cascata” na cobertura dos atentados terroristas
Por Taís Teixeira em 07/12/2015 na edição 879
É notável que os atentados em Paris
(14 de novembro) trouxeram o tema terrorista à tona. O agendamento do tema nos
veículos e nos meios de comunicação foi torrencial, cada qual explorando um
conjunto de aspectos ou todos às voltas requentando as mesmas características
sem apresentar grandes variações.
O fato é que o medo, o pavor, o ódio
e a incompreensão formam os sentimentos mais aflorados com a cobertura que
ficou massivamente em cima da identidade e origem dos criminosos, número de
mortos, perfil dos atingidos, depoimentos e vídeos captados pelas câmeras de
celulares de quem estava no momento do episódio.
Alguns capítulos dessa cabulosa
história tentaram buscar justificativa na religião, política e ideologia para
tentar entender o raciocínio de quem se prontifica a viver para assassinar e,
se for preciso, usar como arma a própria vida. Ou seja: pessoas passam a ficar
receosas e com temor de ser a próxima vítima de algum grupo, ou de alguém, e os
grupos e/ou os “alguéns” passam a se sentir empoderados.
Eis que surge uma questão social
entre mídia e realidade: até quando a cobertura midiática pode passar a
influenciar outros grupos praticantes de extermínio ao dar tanta visibilidade e
espaço ao evento morte por vingança ou qualquer sentimento ou razão que vise à
marcação de território?
Ao dar ênfase e cobertura mundial a
um fato que merece esse espaço pela carga pesada circunstancial e suas
consequências destrutivas, que passa a permear as conversas, os pensamentos e
os sentimentos das pessoas, somos contaminados pelo conceito de agenda-setting.
A formulação clássica surge nos Estados Unidos no final da década de sessenta
com Maxwell E. McCombs e Donald Shaw. A Teoria do
Agendamento pressupõe que as notícias são como são porque os veículos de
comunicação nos dizem em que pensar, como pensar e o que pensar sobre os
fatos noticiados.
Neste caso, a visibilidade da morte
como recurso de vingança marcado pela intolerância à diferença de um grupo que
renega a existência de outros clãs humanos e se compreende possuidor da
supremacia que o capacita a exterminar humanos, ganha repercussão e
desdobramentos geolocalizados, com incidência de mortes “menores”, pois são
conduzidos e contaminados por esta vertente de mortes que ficam sendo
conhecidas através da mídia como solução ou como um grito de ordem, protesto ou
imposição. A mídia não é culpada, mas a sua essência informativa será que não
influencia? Fica para pensar…
Incentivo às
mentes criminosas
Dias depois, outra situação de morte
em uma festa na Califórnia resultou na morte de 14 pessoas e do casal que
comandou a ação (2 de dezembro). Podem ser da mesma facção, grupo, comando,
seja lá o que une ou lidera essas atividades com o evento morte, mas o fato é
que houve morte mais uma vez em massa, num local fechado onde o sentimento de
confraternização e felicidade motivava o encontro. Final trágico para quem
estava no lugar errado e na hora errada, familiares e amigos e comemoração para
quem ordenou a execução. Mais uma vez, os holofotes dão espaço nos veículos de
comunicação ao derramamento de sangue.
O valor-notícia morte e inesperado
sobressaem como resultado agradando aos agentes ativos dos crimes e
desesperando os agentes passivos. Jornalismo como porta-voz do terror. Mas ao
cumprir a função do cerne profissional de informar, não está estimulando um
grupo de fanáticos a continuar agindo para ser temido através da visibilidade?
Não está estimulando grupos facínoras a fazer o mesmo? Rende estudos.
No Brasil, ônibus são queimados por
retaliação a assassinato de traficante. Em Porto Alegre, capital do Rio Grande
do Sul, após um traficante morrer em confronto com a polícia, ônibus coletivos
da cidade e lotações foram incendiados (2 de dezembro), causando medo e
insegurança e evitando que pessoas usassem o transporte público para se
deslocar na cidade. Neste caso, a destruição dos coletivos foi uma reação e uma
resposta à morte de um traficante que não gerou novas mortes, mas criou uma
situação de pânico na comunidade porto-alegrense. Para ser mais claro, 14
ônibus foram queimados em 2015, totalizando um prejuízo de R$ 5 milhões aos
cofres públicos do estado.
Esses dados indicam que essa ação é
recorrente, mas chama a atenção o que foi colocado em prática novamente 15 dias
após o ataque ao Bataclan na capital francesa. Ou seja, se observarmos bem, um
atentado maior de repercussão mundial, devido à dimensão pontuada por ser em
Paris, a cidade luz, numa casa tradicional, com muitas pessoas, foi seguido por
crimes “menores”, todos com o mesmo intuito de causar morte, mostrar força,
exigir respeito e ganhar visibilidade, pois a mídia ao fazer o seu trabalho de
informar acaba, involuntariamente, prestando um serviço de assessoria de imprensa
à criminalidade.
Esses foram dois exemplos, um na
esfera internacional e outro na esfera brasileira, para mostrar como num curto
espaço de tempo, após as mortes em Paris, houve um efeito de “morte em cascata”
em diferentes locais, pois os incêndios começaram a partir de uma morte. Será
que a visibilidade excessiva da mídia em todas as suas formas não acaba
incentivando os criminosos a agir sendo usada como instrumento de submissão e
persuasão às populações? O jornalismo precisa, deve e vive para e de informar.
A mídia, no seu papel nato de informar, ao dar espaço demais (e como definir se
é demais?), não estaria também incentivando mentes criminosas a agir para a
visibilidade midiática ser um instrumento opressor? Fica para nossa reflexão.
***
O candidato-apalhaçado republicano teve generoso tempo de antena em todos os telejornais. Donald Trump pedia para barrar "entrada a muçulmanos nos EUA"!!
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