Do slogan à prática
Isenção, isenção, isenção: foi este
o lema sob o qual o canal informativo se transformou na noite da derrota do
PSD/CDS, assumindo o nome de RTP3 e o rigor, isenção e pluralismo como
princípios editoriais orientadores. Apresentou-se aos portugueses como um
espaço novo e plural, que se pretendia diferente das práticas até aí seguidas,
nas palavras do director de informação da RTP «um canal de referência no qual
os portugueses se revejam porque é o canal de todos». Um mês depois das
alterações feitas à grelha de programação do canal já se percebe claramente o
seu posicionamento, nomeadamente dos painéis de comentário dos principais
programas.
À segunda-feira à noite temos «O
Direito e o Avesso», sobre Justiça, com dois comentadores residentes: José
Pinto Ribeiro, ministro da Cultura do governo PS entre 2007 e 2009, e Saragoça
da Matta, candidato falhado do PSD ao Tribunal Constitucional em 2012.
Terça-feira à noite o destaque vai
para a economia com «Os Números do Dinheiro». Neste, o painel é composto por
Braga de Macedo, ministro das Finanças de Cavaco entre 1991 e 1993, Teixeira
dos Santos, ministro das Finanças de Sócrates entre 2005 e 2011, e Ricardo Pais
Mamede, economista.
Nas noites de sexta-feira são as
notícias que vão a análise em «O Último Apaga a Luz», onde pontuam Raquel
Varela, historiadora especialista na deturpação do papel do PCP na Revolução de
Abril, Joaquim Vieira, jornalista, Rodrigo Moita de Deus, autor do blogue «31
da Armada» e activista monárquico, Virgílio Castelo, actor e apoiante do PS nas
últimas eleições, e Pedro Vieira, humorista e escritor.
Ao sábado, o comentário da semana é
feito em «O Princípio da Incerteza» e fica a cargo de Viriato Soromenho
Marques, mandatário do Livre/Tempo de Avançar em Setúbal nas últimas
legislativas, e Helena Matos, colunista do Observador, autora de livros sobre
Salazar e particularmente conhecida pelo seu furioso anticomunismo.
Também ao sábado, mas mais tarde,
vai para o ar «Política Sueca». Neste programa de análise dos temas da semana
política têm lugar Cristina Azevedo, dirigente de organismo regionais nomeada
por governos do PS, Cerveira Pinto, ex-líder da LCI, e Nicolau Vale Pais,
colunista do Jornal de Negócios.
Com esta amostra vemos o rigor,
isenção e pluralismo que marcam a nova vida do canal informativo da RTP. A
pluralidade é posta em causa quando o comentário político, em regra, é uma
coutada de ex-ministros, nomeados, candidatos e apoiantes de PS e PSD, a par de
outras figuras que se destacam pelo anticomunismo. Não é a rara excepção, de
uma ou outra fugaz aparição para ornamentar a imagem, que esconde a falta de
rigor da RTP3 que chega ao seu lema: nem um vislumbre de isenção e pluralismo.
O serviço público que cabe à RTP
exige mais do que a repetição de slogans sem qualquer colagem com a sua
prática. Ao invés de contribuir para a campanha de manipulação dos resultados
eleitorais, de contribuir para a campanha anticomunista, exige-se que cumpra
aquilo que anunciou na noite de 4 de Outubro: rigor, isenção e pluralismo.
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