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terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Entusiasmo descontrolado sobre a Venezuela

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Entusiasmo descontrolado sobre a Venezuela

Editorial de Le Courrier (Geneve)
GUSTAVO KUHN -

A França, Espanha, Grã-Bretanha, Alemanha e outros países europeus, alinharam finalmente com os Estados Unidos e outros governos latino-americanos governados pela direita. Assim, "reconheceram" na segunda-feira como "presidente interino" da Venezuela Juan Guaido presidente do parlamento, que se autoproclamou chefe de Estado em 23 de janeiro. O anúncio era esperado, e alguns dentre eles lançaram um ultimato ao presidente venezuelano Nicolas Maduro. Operação de notificação formal, seguido-se da negação de um governo em exercício, não deixa de ser surpreendente.

O que atordoa na postura assumida por várias capitais europeias - Berna permanece neutra - é a empolgação em qualificar de “não legítimo” o poder em vigor em Caracas, enquanto esses governos estão constantemente assinando acordos comerciais e militares com regimes que não têm um mínimo de funcionamento democrático. Sem mencionar o silêncio ensurdecedor quando do derrube de Dilma Rousseff no Brasil, Manuel Zelaya em Honduras ou Fernando Lugo no Paraguai.

O golpe diplomático, acompanhado das ameaças de intervenção militar de Donald Trump, torna-se também extremamente perigoso. As múltiplas interferências letais e antidemocráticas dos Estados Unidos na América Latina estão profundamente enraizadas na memória desses povos. E se a crise económica e política é profunda na Venezuela, o governo ainda conta, para desconforto dos seus detratores, de muito apoio popular e do exército. O barulho das botas que se fazem ouvir desde Washington e da fronteira colombiana, levam à radicalização.

Claro que a Venezuela está atolada numa luta política interminável e vive uma situação económica desastrosa. A recessão que a atingiu há vários anos - devido a grandes erros do governo, à dependência quase total do país em relação à produção de petróleo em queda livre, mas também a uma guerra económica travada pela burguesia local e pelas sanções dos EUA - deixou a nação caribenha exangue. Esta crise mergulhou uma grande parte da população na pobreza. A escassez levou centenas de milhares - talvez milhões - de pessoas a buscar uma vida melhor em outros lugares e varreu grande parte do progresso social que tiveram sob a presidência de Chávez.

Mas a situação económica do país, por mais catastrófica que seja, não legitima uma oposição que nunca se conformou com o jogo democrático, que há quase vinte anos tenta derrubar por todos os meios um movimento político que no entanto, ganhou uma longa série de vitórias eleitorais. E justifica ainda menos as manobras de Washington, Brasília, Buenos Aires ou Bogotá, que juraram a perda do "chavismo" em nome de uma cruzada "anticomunista" como se estivessemos noutra época.

No entanto, muitos países europeus deitam petróleo no fogo, em vez de apoiar uma solução negociada, assim como faz o México e o Uruguai. Contudo, apenas uma só evidência surge da situação atual na Venezuela, é que cabe aos próprios venezuelanos, e a mais ninguém, encontrar uma saída para a crise.

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