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quarta-feira, 16 de setembro de 2015

“NA AMÉRICA LATINA HÁ BASES MILITARES E BASES MEDIÁTICAS”

Entrevista conduzida por Héctor Bernardo, para o “Diario Contexto”

 Fernando Buen Abad, filósofo mexicano:

“NA AMÉRICA LATINA HÁ BASES MILITARES
E BASES MEDIÁTICAS”


Fernando Buen Abad é doutor em filosofia, semiólogo, escritor, especialista em meios de comunicação. Foi consultor de vários presidentes, entre os quais Hugo Chávez e Manuel Zelaya. Numa extensa entrevista – que fará parte de um livro sobre pensadores de Nuestra América -, o intelectual de origem mexicana analisa o papel dos media, afirma que a comunicação é um problema de segurança regional e garante que “os meios de comunicação são na realidade armas de guerra ideológicas”

-  O que o leva a dizer que a comunicação é hoje um problema de segurança regional?

-         Só nos poucos anos decorridos desde o começo do século XXI, já contamos cinco golpes de Estado na América latina, e todos eles tiveram como ariete as estruturas monopólicas mediáticas. O alerta está aí, mas a nossa reacção tem sido tardia.

-         Qual foi o papel da Sociedade Interamericana de Prensa (SIP) nesses acontecimentos?

-         No caso da SIP, procuro não exagerar o seu papel, embora se trate de uma aliança de empresários de meios de comunicação. O problema não reside no facto de os empresários se organizarem, o problema é terem na capa a marca e o currículo de uma antologia do terror. Cada um deles é um compêndio de horrores espantosos, não só a nível individual, mas pelos meios que representam e pelos projectos que têm em mente. Contudo, creio que continuam a ser um problema muito menos urgente do que a megaprojecto global de dominação mediática, esse sim um projecto imperial. Neste contexto, a SIP é apenas um peão que faz coisas horrorosas, mas que representam  tão só uma parte desse megaprojecto. Digo isto para que tenhamos a noção da dimensão real do que a SIP representa, mas à sua escala aqueles que a integram são autores de enormes malfeitorias.  Foram o ariete do projecto a que chamámos O Plano Condor Comunicacional.

-         Quais seriam as implicações do Plano Condor Comunicacional?

-         Nos últimos anos desenvolveu­-se uma “metástase” das bases militares na América Latina. Esta questão foi analisada com grande precisão por Atilio Boron e Ana Esther Ceceña, que desenharam rigorosamente o mapa das bases militares na região. O Estados Unidos, que sempre viram o México como parte do seu anel de segurança, agora querem que todo o continente desempenhe esse papel, tanto mais que se trata de um território de segurança com 500 milhões de pessoas cativas do projecto estado-unidense de ampliação de mercado. Uma forma de controlar todo o tipo de resistência é a capacidade de desembarque acelerado de forças militares na região. A fórmula já a vimos no Iraque, já a vimos na Líbia, na Síria, na Ucrânia. O ariete, a ponta de lança de tudo isto, são os meios de comunicação. Trata-se de começar a acusar de serem ditadores  todos os desalinhados que estão ali no poder, convencer o mundo de que “alguém tem de fazer alguma coisa”, e que no dia em que isso aconteça o mundo aplauda e diga: “Finalmente, já derrubaram esse ditador”. Esta fórmula não é nova. É a fórmula que está apontada a Nicolás Maduro e foi apontada a Hugo Chávez. É a fórmula que apontam a Evo Morales, a Daniel Ortega, a Rafael Correa, a Raul Castro, a Dilma Rousseff e a Cristina Fernández. Está claro quem são os inimigos para eles neste cenário.

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-         Que papel desempenham os meios de comunicação num tal contexto?

-         Os meios de comunicação são realmente armas de guerra ideológicas e têm-se reposicionado no continente. Na América Latina há bases militares e bases mediáticas. As bases mediáticas apresentam diversas vantagens sobre as outras. Têm maior capacidade de articulação, de maneira mais rápida e ubíqua. Emitem um comentário difamatório na Venezuela, nessa mesma manhã esse comentário é repetido numa rádio de um bairro em Buenos Aires e com isso marcam a agenda no território, ao mesmo tempo que o grupo espanhol Prisa reproduz a mesma nota em Madrid, a CNN replica-a nos Estados Unidos, o mesmo faz no México a Televisa enquanto na Argentina o Clarin faz a sua parte. Ou seja, há velocidade e sincronismo, elementos básicos de estratégia militar. Há uma luta territorial ao mesmo tempo que uma luta semântica. A isso chamo eu o Plano Condor Comunicacional. Porque agora as forças de repressão comunicacional têm uma capacidade de virulência e coordenação muito rápida. Cheguei há pouco de uma cidade que se chama Azul, e enquanto tomava o pequeno almoço no hotel, a senhora que atendia dizia estar muito preocupada ao ver que “os russos voltaram a ser o demónio” e que “Putin é um Satanás que ameaça o mundo inteiro”. Essa senhora, enquanto atendia os clientes naquele hotel humilde, já tinha a carga ideológica em sincronia com o que ao mesmo tempo se dizia em grande parte do planeta. É esse o Plano Condor Comunicacional, que já realizou a tarefa de se posicionar no campo do imaginário colectivo.

-         Como estrutura?

-         Estou certo de que se tivéssemos dinheiro e instituições fortes para realizar essas tarefas de investigação, identificaríamos estruturas semânticas e sintácticas idênticas. Uma em que trabalhei é a seguinte: quando Peña Nieto ganhou as eleições no México, ele disse: “Lançámos à terra uma semente, e dela nascerá uma árvore, da qual colheremos os frutos”. É a mesma frase dita na  Venezuela por Henrique Capriles, quando perdeu  as eleições para Hugo Chávez, e também na Argentina, em Tigre, Sergio Massa disse exactamente a mesma frase num dos seus discursos: “Estamos a semear uma semente, da qual crescerá uma árvore, que nos dará os frutos”. Se tivéssemos a possibilidade de fazer uma “tomografia computorizada”  do discurso que aquelas bases mediáticas continentais fazem correr na América Latina, veríamos que há matrizes que têm uma orientação e que passam pelo Grupo Random da Colômbia, pela CNN nos Estados Unidos e que vêm do Grupo Prisa, onde se encontram os laboratórios de guerra ideológica e psicológica mais poderosos do mundo.

(Tradução de Armando Pereira da Silva)
http:www.telesurtv.net/bloggers/En-America-Latina-hay-bases-militares-y-bases-mediaticas-200150601-0002.html




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